A Igreja autocéfala da
Polônia é a Igreja dos cristãos ortodoxos que vivem na Polônia. Ela possui seis
dioceses e atualmente é liderada pelo Metropolita Sawa, Arcebispo Metropolitano
de Varsóvia e de Toda a Polônia.
O nome Polônia (Polska)
tem origem na tribo dos polanos, que significa "pessoas que cultivam a terra", derivado da palavra pole que significa "campo". A Igreja Ortodoxa da
Polônia tem sua origem apostólica em Cirilo e Metódio. Seus primórdios remontam
ao período de formação do Estado da Polônia, que se deu no século X. Período em
que os polanos conquistaram a Pequena Polônia, onde habitava a Tribo dos
Vislanos (ou Vistulanos). A Pequena Polônia é uma região histórica do atual
Estado polonês, formando a maior parte do sul do país. Historicamente, até a
Segunda Guerra Mundial, a região incluía também grande parte da atual Ucrânia.
A Tribo dos Vislanos
habitava a Pequena Polônia desde o século VII, onde criaram um estado tribal,
com os principais centros em Cracóvia, Sandomierz e Stradów. No final do século
IX, eles foram invadidos pela Grande Morávia e seu duque foi forçado a aceitar
o batismo cristão. Esse fato é muito elucidativo sobre a origem da Igreja
Ortodoxa em solo polonês. Pois a conversão dos eslavos à ortodoxia,
historicamente passou por um governante da Morávia, chamado Rastislav ou
Rostislav, que governou a Grande Morávia entre 846 e 870.
Em 863, Rostislav pediu ao
imperador bizantino, Miguel III, que lhe enviassem missionários que pudessem
transmitir, em língua vernácula, os ensinamentos de Jesus Cristo. Em resposta,
o imperador lhes enviou dois irmãos ilustrados, Constantino (mais tarde, como
monge, chamado Cirilo) e Metódio, que dominavam as línguas eslava e grega. Para
darem conta dessa missão, os irmãos fundaram o alfabeto eslavo, o que
possibilitou que eles traduzissem os mais importante livros litúrgicos
cristãos.
Embora o trabalho de
Cirilo e Metódio tenha ocorrido na Morávia (aproximadamente a Eslováquia
atual), o benefício atingiu a todas as terras eslavas (especialmente Bulgária,
Sérvia, Ucrânia, Bielorrússia e Rússia). Com a conversão dos Vislanos pelas
mãos dos morávios, o rito de Metódio difundiu-se nas terras polonesas que
faziam fronteira com a Morávia. Dessa forma, missionários eslavos ortodoxos
começaram sua tarefa de iluminação espiritual muito antes dos reis poloneses se
aproximarem do cristianismo romano.
Em 954 Princesa Olga de
Kiev foi batizada. Isto abriu o caminho para o batismo de Vladimir de Kiev,
neto de Olga, em 988. Vladimir (reinou 980-1015) casou-se com Anna que era irmã
do imperador bizantino. Nesse contexto, a Ortodoxia tornou-se a religião de
Estado na Rus.
No século X, as terras dos
vislanos foram conquistadas pelos polanos e incorporadas ao estado polonês. No
entanto, supõe-se que já nesse mesmo século X, bispados ortodoxos de rito
metodiano já tivessem sido fundados em Cracóvia e Vislica. A Igreja Ortodoxa
tornou-se uma continuação da Tradição Metodiana na Polônia.
Mieszko I unificou os
territórios polacos e foi o primeiro duque da Polônia. Ele casou–se com a
princesa Dobrawa, que, por ser tcheca, tinha fortes ligações com a Ortodoxia (o
que é atestado pelo martírio de São Wensceslas (Vaclav ou Viacheslav) que
ocorreu em 935). Foi logo depois de seu casamento com Dobrawa, em 965, que
Mieszko I aceitou o batismo, no ano de 966.
Do século X ao século XIII
houve um contínuo desenvolvimento da Igreja Ortodoxa em solo polonês, com a
fundação de vários bispados. No entanto, de modo geral, os reis poloneses
mantiveram-se ligados ao catolicismo romano. Disso resultou que algumas regiões
da Polônia estavam sob jurisdição eclesial do Patriarcado de Constantinopla,
enquanto outras estavam sob jurisdição eclesial do Papa de Roma.
No entanto, esse
desenvolvimento da Igreja Ortodoxa em solo polonês foi abalado pela destruição
do poder de Kiev pelos Tártaros (século XIII). Como consequência dessa
destruição, a parte sudoeste da Rus, conhecida como pequena Rus (atual
Ucrânia), teve uma parte de seu território absorvida pela Polônia e, outra
parte, absorvida pela Lituânia em 1386.
A Lituânia foi o último
país pagão na Europa. No entanto era, na época, um reino em ascensão na região.
No século XIII eles conquistaram a Bielorússia e no século XIV a Ucrânia,
incluindo a cidade de Kiev. Em 1385 ocorreu a união pessoal entre os reinos da
Lituania e da Polônia, com o Grande Duque Lituano Wladyslaw Jagiello aceitando
o batismo e tornando-se Rei da Polônia. O novo estado polaco-lituano tinha uma
área total de 1 milhão de km², com capital em Cracóvia. Outras cidades
importantes eram Vilnius, Kiev, Poznán, Torun e Gdansk.
Em 1569, a Polônia e a
Lituânia formaram a Comunidade Polaco-Lituana, na chamada União de Lublin. Com essa União, uma porção considerável do
território ucraniano, a pequena Rus, passou do controle lituano para o polonês.
Sob pressão, a maior parte da elite rutena (de origem eslava) converteu-se ao
catolicismo romano. Ma o povo daquela região manteve-se fiel à Igreja Ortodoxa.
Havia, então, uma situação em que um rei católico governava um povo, no seio do
qual havia uma substancial minoria de ortodoxos.
No entanto, esses
ortodoxos estavam em situação difícil, pois a jurisdição eclesial do território
era do Patriarcado de Constantinopla, que se encontrava impossibilitado de
exercer qualquer controle sobre o clero. A ex-capital bizantina havia caído sob
domínio dos turcos mulçumanos em 1493. De modo que, no período da Comunidade
Polaco-Lituana, a indicação dos que deveriam receber a sagração episcopal
passou a ser feita pela Igreja Católica Romana, por intermédio do Rei da
Polônia.
Por outro lado, a invasão
tártara (mongóis) não conseguiu quebrar a Igreja Ortodoxa entre os eslavos. A
Igreja conseguiu sobreviver como uma força real que consolou o povo em seu
sofrimento. Ela deu uma contribuição material, espiritual e moral para a
restauração da unidade política da Rússia, dando a garantia de uma futura
vitória sobre os invasores.
A Rússia, que surgiu a
partir do período Mongol foi um país exteriormente muito diferente da antiga
Rus. Kiev nunca se recuperou do saque de Batu, o neto de Genghis Khan, em 1240.
No século XIV o lugar de Kiev foi ocupado pelo Principado de Moscou. Foi o Grão-Ducado
de Moscovo que inspirou a resistência e finalmente a libertação do julgo
mongol. A ascensão de Moscou foi intimamente ligada com o crescimento da
Igreja. Quando a cidade ainda era comparativamente pequena e insignificante,
Pedro, Metropolita da Rússia, em 1308-1326, decidiu estabelecer-se ali. E daí
por diante, Moscou permaneceu como a cidade do hierarca chefe da Rússia. E essa
nova importância religiosa da cidade foi decisiva para fazer dela o novo centro
de unificação política do país.
Como vimos, desde o século
XIV a Polônia foi um estado multi-cultural, multi-étnico e multi-religioso. No
entanto, as autoridades da Polônia por muito tempo trabalharam para que a
Igreja Ortodoxa Polonesa se vinculasse ao Papa de Roma, sob o pretexto de
reunificar o cristianismo. Com a chegada dos jesuítas em 1564, a pressão sobre
os Ortodoxos aumentou, com grande parte da população se convertendo ao
catolicismo romano. A situação da Igreja era de pobreza; o clero era inculto e
os bispos não tinham recursos para promover corretamente os serviços litúrgicos
e a estrutura eclesial. Muitos sacerdotes foram ordenados sem formação de base
e foram desenvolvidos novos ritos, que não eram nem latino, nem grego, em seu
caráter.
Em paralelo a esses
acontecimentos, houve uma grande mudança no mundo ortodoxo. Ao libertar-se dos
invasores, o Estado russo ganhou força e junto com ele a Igreja Ortodoxa Russa.
Em 1448, a Igreja Russa tornou-se independente do Patriarcado Ecumênico de
Constantinopla. Ao Metropolita Jonas, sagrado pelo sínodo russo em 1448, foi
dado o título de Patriarca de Moscou e Toda a Rússia. Pouco depois, em 1493, o
Império Bizantino entra em colapso com a tomada de Constantinopla pelos turcos.
Nessa situação, os bispos
da pequena Rus, situada em território polonês, ficaram submetidos a diferentes
tensões: de um lado uma Constantinopla submetida ao domínio mulçumano, em
contraste com o Patriarcado Russo associado à ascensão do novo Império
Moscovita; de outro lado, havia um rei polonês católico que trabalhava para
converter ao catolicismo, a parcela ortodoxa da população do reino.
Em 1595-1596, ocorre a União de Brest, fundada na decisão do
"Metropolita de Kiev-Halych e de toda a Rus", de cortar relações com
o Patriarca de Constantinopla e se colocar sob as ordens do Papa de Roma. No
sínodo em Brest, seis dos oito bispos do Sínodo Ortodoxo apoiam a União com
Roma, mas os três bispos restantes, todos do extremo oeste da Ucrânia e da
Polônia oriental (Lviv, Lutsk e Przemysl), não aderiram de imediato a União. No
entanto, essa resistência foi posteriormente revertida em adesão (1700, 1702 e
1693, respectivamente).
Os hierarcas, reunidos no
sínodo de Brest, redigiram os 33 artigos da União que foram aceitos pelo Papa
de Roma. Os fiéis ortodoxos foram recebidos na condição de católicos gregos
(uniatas), com a autorização de continuar várias práticas orientais, incluindo
a Liturgia em Eslavão, a ordenação de homens casados e a comunhão com pão e
vinho. A união foi fortemente apoiada pelo Rei da Polônia, Sigismundo Vaza III,
mas combatida por alguns bispos e importantes nobres da Rus, e, principalmente,
pelo nascente movimento cossaco em prol de um auto-governo ucraniano. O
resultado foi a luta ‘Rus' contra ‘Rus', e a divisão dos ortodoxos da pequena
Rus em jurisdições greco-católica (também conhecida por uniata) e
greco-ortodoxa.
Em 1620, o Patriarca de
Jerusalém Theophanes III chegou a Kiev e consagrou uma hierarquia ortodoxa,
incluindo Job (Boretsky) como Metropolita de Kiev. Assim, surgiu para a Igreja
Apostólica, uma situação de um mesmo território estar sob jurisdição de um
bispo ortodoxo e, ao mesmo tempo, sob jurisdição de um bispo católico.
Sentindo-se traídos pelos
nobres rutenos, convertidos em uniatas e pelo rei católico, que trabalhava para
suprimir a Fé ortodoxa em todo o território do reino, os cossacos e os
camponeses pobres, do extremo oeste da Ucrânia e da Polônia oriental,
voltaram-se para Igreja Ortodoxa Russa. Houve, então, a eclosão da grande
rebelião cossaca de 1648, contra a Comunidade Polaco-Lituana e o Rei João
Casimiro II.
Como consequencia imediata
dessa rebelião, houve a partilha do território ucraniano entre a Polônia e a
Rússia, após o tratado de Pereyaslav e a Guerra Russo Polonesa. Posteriormente,
no século XVIII, houve a partilha da própria Polônia, entre a Prússia a Áustria
e a Rússia.
A lealdade dos fiéis
variou entre a Ortodoxia e a União com Roma ao longo dos séculos que se
seguiram. Também a tolerância entre os regimes dominantes e as pessoas tem
variado, sob influência das mudanças de fronteiras que aconteceram na história
política polonesa. O martírio de Maxim Sandovich ilustra a tensão dessas
relações.
Quando a Polônia foi
restaurada como país independente, no começo da I Guerra Mundial, cerca de 4
milhões de cristãos ortodoxos ficaram incluídos dentro de seus novos limites. A
maioria deles estava sob a jurisdição do Patriarcado de Moscou e eram das
etnias bielorrussa e ucraniana.
Pouco depois de sua
independência, o governo polonês começou a promover a idéia de instituir uma
igreja autocéfala, independente de Moscou. Em 13 de novembro de 1924, o
Patriarcado de Constantinopla outorgou o status de autocefalía à Igreja
Ortodoxa da Polônia e, em 1927, outorgou ao Metropolita de Varsóvia, o título
de “Beatitude.”
No entanto, o gesto do
Patriarcado Ecumênico não teve muito efeito prático, pois a maioria dos bispos
eram russos e eles continuaram ligados ao Patriarcado de Moscou. “Durante os
anos 30, produziram-se desafortunados incidentes entre as Igrejas
Católico-romana e Ortodoxa da Polônia. O Metropolita Dionísios de Varsóvia,
protestou formalmente pelos incidentes anti-ortodoxos, sustentando que muitos
de seus sacerdotes foram forçados a rezar em polonês, que muitas de suas
igrejas haviam sido forçadas a fechar e que outras tantas haviam sido
destruídas. Alem de tudo isso, denunciou que se estava exercendo pressão sobre
os fieis ortodoxos para que se convertessem ao catolicismo. O próprio
Metropolita católico-ucraníno, mons. Sheptytsky, corroborou aquelas acusações e
somou sua voz àquela dos ortodoxos. Este fato ficou plasmado em uma carta
pastoral dirigida a seus fieis.” [1]
Quando o Leste da Polônia
foi anexado à União Soviética em 1939, a maioria dos ortodoxos poloneses foram
reintegrados ao Patriarcado de Moscou, de modo que a Igreja Ortodoxa da Polônia
se viu reduzida significativamente em tamanho.
Em 1948, quando os
comunistas tomaram o governo da Polônia, o metropolita de Varsóvia foi deposto
por causa de sua oposição ao novo regime. Mas neste mesmo ano, o Patriarca de
Moscou reconheceu a Autocefalia da Igreja Ortodoxa da Polônia.
Hoje, a Igreja da Polônia
é liderada pelo Arcebispo Metropolitano de Varsóvia e de Toda a Polônia e
inclui seis eparquias (dioceses): Varsóvia e Bielsk, Bialystok e Gdansk, Lodz e
Poznan, Wroclaw e Szczecin, Lublin e Chelm, e Przemysl e Nowy Sacz, além de uma
unidade fora da Polônia que é a Eparquia do Brasil . A maioria dos cristãos
ortodoxos estão localizados no leste da Polônia, onde o Eslavo antigo é a
língua litúrgica. Mas existem algumas paróquias, espalhadas por toda a Polônia,
onde o polonês é utilizado durante os serviços. Nas últimas décadas os crentes
ortodoxos também voltaram à região Lemko, que faz parte da Eparquia de Przemysl
e Nowy Sacz. O eslavo antigo é geralmente utilizado como língua litúrgica na
área Lemko. Estima-se que há cerca de um milhão de Ortodoxos na Polônia.
Texto: Lucas Mesquita
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