Palestra
catequética proferida por D. Chrisóstomo,
Arcebispo da Eparquia Ortodoxa do
Brasil,
jurisdição da Igreja Ortodoxa Autocéfala da Polônia,
em 20/11/2011
Esta
festa comemora a entrega da Santíssima Virgem Maria ao templo. Segundo a
tradição da Igreja ela era uma menina de três anos de idade. E essa menina era
o resultado de uma súplica e uma promessa feita pelos pais. Todas as pessoas
que querem ter um filho, quando não conseguem - há mulheres que têm dificuldade
de engravidar e homens que têm dificuldade de fecundar - fica uma frustração. A
pessoa quer ser pai, quer ser mãe, e não consegue, fica uma frustração. Vocês
imaginem que, além disso, tanto o pai quanto a mãe da Santíssima Virgem,
Joaquim e Ana, viviam numa sociedade em que esta situação acarretava uma
vergonha social, porque eles eram judeus.
O
povo judeu foi constituído por Deus, por Iahweh no deserto, e o mandamento que existe
desde o livro do Gênesis, 'crescei e multiplicai-vos', era uma regra dentro do
povo judeu. Quer dizer, toda vez que uma mulher paria uma criança, ela estava
fazendo crescer o povo de Deus, e era sinal claro que Deus a abençoou. Porque
aquela mulher frutificou. Vejam a situação de Joaquim e Ana, a vida inteira
querendo ter um filho e não conseguindo.
Além
da frustração pessoal, além da maternidade e a paternidade frustradas, havia a
vergonha perante os outros, e esta culpa: "Deus não me faz frutificar".
Quando
fomos a Jerusalém vimos o mosteiro Chozebita (chozeba significa o silêncio),
mas não pudemos entrar, pois não aceitavam visitação. O mosteiro que foi
construído a partir da gruta em que, diz a tradição, Joaquim se recolheu por
quarenta dias, em jejum e oração, pedindo a Deus que lhe desse um filho. (Ainda
segundo a tradição, ela seria a mesma gruta em que Elias foi alimentado pelos
corvos). É nessa gruta que Joaquim faz uma promessa. Se Deus lhe desse um
filho, ele o entregaria ao Templo.
Após
a promessa, Santa Ana engravida e dá à luz uma menina. Mas para cumprir a
promessa é preciso esperar a criança ganhar uma pequena autonomia. Aos três
anos ela é entregue ao Templo. Esta é a Festa que comemoramos.
A
primeira coisa a ressaltar é que existe uma esterilidade, e isto tem a ver
conosco. De certa forma, todos nós corremos o risco de estarmos espiritualmente
estéreis. Qual de nós está conseguindo frutificar ou produzir algo espiritual
diante de Deus? Pelo ponto de vista da santificação e pelo ponto de vista
espiritual, fechados em nós mesmos, somos todos eunucos, somos todos estéreis.
Mas em uma súplica a Deus, em diálogo com Deus, recorrendo a Deus, o pedido
teve resposta e frutificou. Houve um fruto. E este fruto foi entregue a Deus.
Temos
de parar para pensar que, se, por um lado, há uma esterilidade em nós. Por
outro lado, todos nós somos capazes de frutificar alguma coisa, temos alguma
qualidade, temos algum dom, somos capazes de fazer alguma coisa. A questão é o
que fazermos com este dom. Isto está completamente relacionado com a história
dos talentos. O que eu faço com os dons que tenho. Estes dons servem para mim?
Estes dons são meus?
Todo
cristão tem de entender que, em última instância, tudo o que temos nos foi dado
por Deus. Claro que vem através de alguém, vem através do pai, da mãe, do
patrão, do professor, do irmão, do filho; mas em última instância, foi enviado
por Deus, Deus permitiu que acontecesse. Se eu tenho algum tipo de
inteligência, veio de Deus; se tenho alguma paciência, veio de Deus; se tenho
algum tipo de sensibilidade, veio de Deus.
A
apresentação da Santíssima Virgem Maria ao Templo é exatamente a percepção (que
temos de ter) de que nossas capacidades, nossos dons, de alguma maneira têm de
estar disponíveis para o próximo, e pelo próximo. Devem estar, em última
instância, disponíveis para Deus. Há de se ter uma entrega.
O
terceiro aspecto desta Festa é que há verdadeiramente um encontro, que é uma
passagem de um estado para outro. Começa a existir uma passagem da Antiga
Aliança para uma Nova Aliança. Deus faz a aliança com um povo no deserto e
institui uma série de regras para este povo, que, se fosse fiel a elas, seria
multiplicado e abençoado. Este povo seria poderoso na terra e derrotaria todos
os que o atacassem e seria exemplo e guia para todas as nações na terra. Uma
das regras estabelecidas por Deus para este povo é que construísse um
Tabernáculo, uma tenda. E explicou como construí-la.
São
dois livros inteiros explicando isto, Números e Levítico. Dizem que material
usar, qual o tecido, qual a madeira, qual o metal, quais as pedras. Deus dá o
tamanho, a medida, diz os móveis que tem de estar lá dentro, como usar, o quê
fazer, qual a utilidade desta tenda. Esta tenda é um ponto de encontro entre
Deus e o homem. Ali tinha uma série de rituais que Deus ensinou ao homem e que
eles tinham de fazer. Ritual para tudo. Para perdoar os pecados, para se
purificar depois da menstruação, para selar uma aliança, um negócio, um
casamento, um divórcio, uma reconciliação de um casal.
Tinha
ritual para tudo. E, dependendo do ritual, tinha de se sacrificar uma pomba, um
carneiro, um boi. Às vezes se oferecia o trigo ou a farinha. Tudo isto está
explicado e se encontra em Números e em Levítico.
Quando
este povo recebe a promessa de Deus de ocupar uma terra, a terra que emana
leite e mel, esse povo achou que esse negócio de carregar uma tenda nas costas
estava muito “chato”. “Vamos botar Deus sossegadinho num canto”. Então
construíram um Templo. E Deus permitiu, Deus abençoou, abençoou Salomão, e
Salomão vai construir um Templo magnífico, uma coisa maravilhosa para a época.
É neste Templo que a Santíssima Virgem Maria será entregue.
Mas
na verdade, quando Deus fez uma aliança com o povo no deserto, no plano de
Deus, o que Deus queria era justamente o diálogo. O face a face, a cooperação,
e a participação do homem no plano divino. Esta é a idéia. O homem não foi
criado por Deus para viver sozinho. O homem é um ser social, o homem precisa do
próximo. O homem foi criado para o diálogo, e o diálogo mais sublime do homem é
justamente com seu Criador.
A
idéia que rege toda a Sagrada Escritura é justamente esta: o diálogo entre o
Criador e Sua criatura, entre Deus e o homem. E o ponto culminante deste
diálogo seria no Templo. A entrada da Santíssima Virgem Maria neste Templo é o
início de uma transformação deste próprio Templo, conseqüentemente deste
diálogo. Este Templo que estava institucionalizado, que tinha um conteúdo
simbólico enorme - pois todos os judeus, que estavam espalhados pelo mundo,
tinham por objetivo de vida ir, pelo menos uma única vez, a Jerusalém para
sacrificar no Templo - era algo de importantíssimo na vida de um judeu.
A
Santíssima Virgem Maria é entregue a este Templo e dele sai com a idade de
catorze anos. Sabe-se que a saída foi na primeira menstruação dela, pois a Lei
não permita mulheres em seu período menstrual ao interior do Templo. Então com
o advento da menarca ela teve de sair, mas os pais já tinham morrido, pois eram
bem velhinhos. É assim que quando esta menina é entregue ao Templo, começa a
haver uma ultrapassagem nesta Aliança. Ela dá um avanço. Ela dá um salto de
qualidade.
Até
então, este Deus, que dialoga com o povo no deserto, era um Deus de mistério.
Ele não tinha rosto. Ele era invisível. Não tinha nome. Quando Ele explicou
algo de Si próprio disse "Eu sou Aquele que É". E o mistério era tão
forte para os judeus que eles sequer mencionavam o Nome de Deus. Iahweh são as
iniciais desta frase, "Aquele que É". Não falavam o Nome, era o
próprio Mistério. A única certeza que se tinha era que, uma vez por ano, quando
o sacerdote entra-se no santuário para queimar o incenso, neste momento, Iahweh
estaria ali. Através dos Querubins, espiritualmente...não se sabia como, mas
Deus estaria ali naquele momento, essa era a que o judeu tinha.
Mas
no Plano de Deus, Deus quer a intimidade, quer o diálogo, quer o contato com o
homem. E aí entra a Santíssima Virgem Maria nessa estória, aquela que vai ser,
mais adiante, mais tarde -- na próxima festa que vamos celebrar --, a escolhida
para Deus encarnar. Aquele Deus misterioso, Aquele Deus difícil, Aquele Deus
terrível, que era o Senhor dos Exércitos vai tornar-Se pequeno, igual aos
homens para com eles poder conversar. Mistério sublime!
Na
subida de Moisés no Monte Sinai onde ele recebe as Tábuas da Lei, que depois
serão guardadas na arca que ficará no Templo, a presença de Deus é descrita
como uma espécie de vulcão. Era fogo, fumaça, barulho ensurdecedor, uma coisa
tão pavorosa que o povo nem teve coragem de subir. Só Moisés foi homem
suficiente para ir lá pra cima. E não foi possível descrever nada. E, quando
voltou da montanha, Moisés parecia um sol, todo iluminado. E aquilo nem era
Deus em Si, mas só a Glória de Deus.
Este
Deus terrível, de um distanciamento profundo do homem, tinha por Plano
justamente o encontro. Só Deus podia realizar esta obra. O homem não tem
capacidade disto. Lembram-se da história da esterilidade, da nossa
incapacidade? Então isso só pode ser obra de Deus. No Plano de Deus, desde Adão
e Eva no Paraíso, mesmo que Adão e Eva não fossem expulsos do Paraíso, um dia
Deus iria Se manifestar como homem para poder dialogar com o homem, na
proximidade e na igualdade de um face a face. E para ser um homem perfeito, Ele
tinha de perfeitamente nascer como todos os seres humanos nascem: do ventre de
uma mulher. Tinha então de surgir a mulher certa para que Deus encarnasse dela.
Essa
mulher foi o fruto de uma promessa. Foi aquela filha que São Joaquim e Santa
Ana pediram, e que foi entregue ao Templo como eles prometeram. A menina vai
ser educada no Templo. Onde, sendo alimentada pelos anjos, vai aprender o
necessário para realizar sua vocação. Todas aquelas regras que Iahweh ensina no
deserto para o povo, ela aprende na educação dela no Templo. Ela era, digamos
assim, uma perfeita judia. É ela que é escolhida. É dela que Deus encarna. O
que nos leva a outro aspecto, que para mim é o mais importante. É o salto de
qualidade que se celebra nesta festa, onde o novo Templo é a Igreja, e onde o
novo povo de Deus são os cristãos.
Mas
o Templo do cristão não é esta casa que vemos aqui. A Igreja não é algo
externo. A instituição Igreja é uma ferramenta, um veículo, algo palpável e
indispensável para o homem. No entanto, enquanto nave ou arca da salvação e da
deificação, ela é antes um meio de se viver a Igreja interior. Na essência,
pela Vontade de Deus, pelo Plano de Deus, o novo Templo somos nós. Está nas
Epístolas de São Paulo. São Paulo ensina isto: “Ou não sabeis que o nosso corpo
é o templo do Espírito Santo, que habita em vós, proveniente de Deus, e que não
sois de vós mesmos?” (ICo. 6,19). Ele diz que quem prostitui o corpo, prostitui
o Templo do Senhor. Ele disse, este corpo não vos pertence é de Deus.
Nosso
Senhor em Jerusalém foi acusado, dentre outras coisas, de ter dito que se podia
derrubar o Templo, que Ele o reconstruiria em três dias. Ele se referia aos
três dias em que desceu aos mortos e ressuscitou. Que, simbolicamente, são os
três dias em que deixamos de tomar banho depois do batismo. O Novo Templo, o
Templo da Nova Aliança, a plenitude da Revelação é o corpo do homem. E a
Santíssima Virgem Maria vai ser a primeira. Ela é a Igreja por causa disto,
porque ela terá o Cristo dentro de si em carne e osso.
Mas
não é só ela, nós também temos de ter. Se não tivermos o Cristo dentro de nós,
não somos nada. Pensamos que somos cristãos e não estamos sendo. Porque para o
sermos temos de ter o Cristo dentro de nós. Nós comungamos a carne e o sangue
na Eucaristia, este Cristo que comungamos tem de ser real para nós. Todo o meu
ser tem de alguma maneira estar entregue a este projeto. E é isto que a
Santíssima Virgem realiza. O meu corpo, meu pensamento, meus sentimentos, minha
inteligência, todas as capacidades, meus dons, e inclusive os meus defeitos,
têm de estar envolvidos neste projeto de construir um Templo, de me encontrar
com Deus num Templo. E este encontro se faz aqui dentro, em nosso interior.
Os
alunos que estiveram ontem na aula são capazes de entender um pouco melhor do
que estamos falando, estamos falando da oração. De alguma maneira o Cristo tem
de estar vivo dentro de mim. Não em carne e osso, pois não sou capaz de
biologicamente parir nada, muito menos um Cristo, mas espiritualmente sim. E
quando, na Igreja, vivo todo este ritual de cantar, de orar, de jejuar, de contemplar
os ícones, cheirar o incenso, ouvir a música, me esvaziar interiormente pelo
jejum. Depois me aproximar daquele pão e daquele vinho, que se transformaram em
carne e sangue, e receber a Eucaristia. Tudo isto são rituais que vão me
preparando para ser este Templo. E isto não acontece só durante a Sagrada
Liturgia, isto tem de ser um projeto de vida.
A
imagem que faço é que a vida em Igreja é mais ou menos como caminhar no
deserto, e de vez em quando a gente encontra um oásis. Então encontramos o oásis,
matamos a sede, nos alimentamos das tâmaras que lá se encontram, descansamos,
repousamos, depois caminhamos até o próximo oásis. O oásis é justamente a
Sagrada Liturgia. Aliás, todos os ofícios que fazemos na Igreja: as Vésperas,
as Matinas são um oásis. Mas se me alimento num oásis e depois saio de mãos
vazias para o próximo oásis, quando lá chegar, vou estar no mesmo estado em que
cheguei ao primeiro. Para esta caminhada até o próximo oásis, tenho de ter um
farnelzinho, não é? Tenho de levar água e alimento para a viagem, senão chego
lá pior do que estava. Este alimento que tenho de levar na viagem é o nosso
rosário do dia a dia.
Tem
de haver uma ligação da nossa vida durante a semana, em nossas casas, na
família e com os amigos, com aquilo que vivemos dentro da Igreja. Ou seja,
nossa vida tem de ser litúrgica. E a Igreja, ao longo da nossa vida, vai
programar as coordenadas dessa viagem. Não foi ninguém em especial que parou e
pensou. Foi a vida da Igreja, os Santos que viveram dentro dela, os homens e
mulheres que viveram e que derramaram seu sangue na Igreja, que foram pouco a
pouco permitindo a elaboração, digamos assim, de um sistema dinâmico de
espiritualidade na realização destas Festas.
Nós
temos três festas móveis, que são o Domingo de Ramos, o Pentecostes e a
Ascensão, centrados na Páscoa (a décima terceira Festa, a Festa das Festas). E
temos nove festas que são fixas. A primeira já foi, a Natividade da Virgem
Maria: nasceu e surgiu a Igreja. Surgiu e nasceu o Templo Novo. A segunda é a
cruz, a exaltação da Santa Cruz. Pois não existe possibilidade de viver uma
vida litúrgica, não existe possibilidade de ter um encontro com Deus em um
Templo qualquer, se não for passando pela cruz. Vocês podem ver o exemplo desta
menina, da Santíssima Virgem Maria. Ela lá tinha culpa do raio de promessa que
o pai e mãe fizeram? Se calhar, se deixasse aquela menina crescer naturalmente,
ela iria querer ficar brincando de boneca, ia querer namorar, ir a festas, como
toda menina normal. Ou não? Pois nem perguntaram o que ela queria, com três
anos a enfiaram dentro de um Templo. Tem crucificação maior do que esta? E
vejam bem, ela aceitou a cruz, então aquele dito de Cristo "Se alguém quer
vir após mim, negue-se a si mesmo, e tome cada dia a sua cruz, e siga-me” (Lc.
9. 23), ela realizou. Não se revoltou, não se rebelou, não tentou fugir do
Templo, e quando se viu "livre" do Templo, não disse "oba, agora
estou por minha conta!" Não! Ela continuou o projeto do pai e da mãe, e o
projeto do Templo.
Ela
também não era boba, vamos aqui combinar. Porque a mulher naquela época com um
marido era uma situação...A mulher valia meio camelo! Para que serve meio
camelo? Para nada. Trocava-se uma mulher por dois camelos. E mulher sem um
homem era um problema, era menos do que um cão. A mulher era propriedade do
marido. E, se este morresse, ela tinha de casar com o cunhado. Se ela não
tivesse irmão, pai, tio, alguém que cuidasse dela, estava perdida. E mais, ela
era a serva ‘número um’ da casa. Ela tinha de carregar todo o serviço da casa
nas costas. Ela ia querer isso? Depois de tudo o que aprendeu dentro do Templo?
Ainda mais, com as profecias que diziam que o Salvador nasceria de uma virgem?
"Ah,
quero nada", talvez dissesse ela, "quero lá homem mandando em mim
nada". Então: "eis aqui a serva do Senhor, faça-se em mim conforme a
tua Palavra". O jeito que houve foi arrumar um ancião para casar com ela,
que,além do mais, era primo dela, não por acaso.
Foi
feito um acordo para que ela pudesse sair do Templo. Ela teria de ficar sob o
abrigo de alguém. Vários homens, vários príncipes, se candidataram a casar com
ela, porque ela era também da Casa de Davi. Ela era uma princesa. E ela, junto
com os sacerdotes, escolheu José. Feita a escolha, arranjaram o casamento.
Então,
vejam a seqüência. Temos a Igreja nascente. Esta Igreja é o local do encontro
com Deus. Encontro que não tem como não ser na cruz, porque foi nela que Deus
nos trouxe a salvação. Foi pela cruz que Deus desceu aos infernos e
ressuscitou. Então, nós temos de passar pela cruz, como a Santíssima Virgem
Maria passou. E temos de pensar que, de alguma maneira, também temos de nos
entregar. Não mais no Templo e sim enquanto Templo, pois agora o templo é
outro.
Há
de existir uma crucificação de nossas vidas, de nossos desejos, de nossas
vontades, de nossas preferências, e uma tentativa de abrir um espaço interior
para reconhecermos Deus dentro de nós. É preciso um esvaziamento para que Ele
se faça dentro de nós. Esta é a crucificação. Tem de ser feita para que haja
este verdadeiro encontro, que é a festa que vamos celebrar. Só então, o Cristo
nasce e se faz dentro de nós.
É
um erro, um pecado, uma burrice pensarmos que existe um eu que carrego comigo
separado da Igreja que fica lá, ‘plantada’ num certo endereço. E na Igreja tem
um padre, tem um bispo, tem uma Heloísa que sabe cantar, tem um Acácio que faz
a leitura, um acólito que canta bem... Ou seja, como se a Igreja fosse algo de
exterior a mim. Como se o meu ‘eu’ não tivesse nada a ver com isto. Não é
assim. Ou você é a Igreja ou você não é nada. Pois tudo isso que acontece lá
dentro são apenas imagens, ferramentas, símbolos, rituais daquilo que eu tenho
de ser enquanto cristão. Percebe? É por isto que sempre retornamos...
Ritual
vem de uma palavra em sânscrito que é 'rita', significa 'ordem'. Nós temos de
nos conhecer a nós próprios, nos reconhecermos como filhos de Deus, como ícones
de Deus, imagem e semelhança de Deus, para sermos verdadeiramente quem nós
somos. E não aquilo que esta cultura inventa, ou que nós inventamos para nós
mesmos. Nós, no mundo, vivemos papéis, vamos assumindo máscaras (personas).
Vamos assumindo o papel de pai, o papel de mãe, de professor, de filho, de
aluno, de jovem, de velho e etc., sem sabermos qual o significado, qual a
essência destes papéis que estamos assumindo. Porque, no fundo, no fundo, temos
um ser interior, temos uma essência que dá qualidade a todos estes papéis que
temos de assumir mesmo.
Não
temos nem de assumir todos, pois tem gente que não nasceu para ser pai, tem
gente que nasceu para outra coisa. Então temos de conhecer quem verdadeiramente
somos, para que esta nossa essência dê significado aos papéis que assumimos. É
para isto que estamos na Igreja. É por isto que a Igreja é chamada de hospital,
porque ela cura. E de certa forma, esta é a esterilidade espiritual de que
falei. Espiritualmente estamos todos doentes, pois não somos exatamente como
Deus nos fez. Temos de descobrir isto, quem verdadeiramente somos. É
essencialmente para isto que existe Igreja. De certa forma, a Igreja é também
uma escola, pois vou aprender sobre mim, sobre Deus e sobre o mundo. Então, de
certa forma, a cor do santuário não ficou mal, né? Cor de hospital. [risos.]
Então
é isto que é a Igreja. E todo este mistério é celebrado por nós, em aspectos
diferentes, em cada uma das festas ao longo do ano. Então, nos próximos dias,
parem e pensem nisto. Parem e pensem mesmo. Peguem o rosário de vocês, orem um
pouco, e depois fiquem com a idéia fixa ali. Meditar é isto. Tentar fixar uma
idéia, parada ali. Não dialogue com ela, não. Pare-a ali, a idéia do encontro.
Esta é a idéia, do encontro de vocês com Deus. Da mesma maneira que a
Santíssima Virgem foi ao encontro de Deus no Templo, nós também temos de ir. É
assim que a gente celebra a Festa da Apresentação da Santíssima Mãe de Deus no
Templo.
Transcrito por André
Fonte: http://www.igrejaortodoxadobrasil.org.br/apresentacaocatequese.php
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